Plenitude do vazio


A segunda frase da bíblia diz que a terra “era sem forma e vazia” (Gênesis 1.2). A mesma expressão aparece em Jeremias: “Olhei para terra, e ei-la sem forma e vazia” (4.23). Que vazio é este?
A julgar pela narrativa bíblica da criação, o vazio era enorme. E feio. Não havia porção seca, não havia grama, não havia árvores, não havia flores, não havia frutos, não havia estrelas, não havia lua, não havia aves, não havia peixes, não havia animais de nenhuma espécie, não havia comida para comer, não havia semente para plantar, não havia ordem, não havia beleza, não havia forma, não havia gente, não havia mulher, não havia crianças, não havia musica, não havia templos, não havia nada, absolutamente nada.
Este é um vazio do tamanho do céu e da terra. Mas não é a plenitude do vazio. A plenitude do vazio da alma. Um vazio intolerável. Um vazio esquisito. Um vazio que envelhece, que adoece, que leva ao álcool, que leva ás drogas, que leva á morte. A alma tem sede Deus, mas não bebe a água viva que jorra do seu trono. A alma suspira por Deus, mas não busca. A alma quer repouso, mas não se aquieta em Deus. A plenitude do vazio é aquela experiência contrária à experiência do salmista: “O meu cálice transborda” (Salmos 23.5). É a experiência contrária à experiência de quem fica cheio do Espírito Santo (Atos 2.4).
O pobre que volta para casa de mãos vazias depois de pedir socorro aqui e acolá, o aflito que recebe consolações vazias depois de chorar em ombros alheios, o pecador que continua vazio depois de se entregar sem reservas aos prazeres transitórios do pecado, têm vazios decepcionantes, todavia ainda menores que os vazios da alma. Assim como a terra não é mais sem forma nem vazia por causa da ação de Deus, este mesmo Deus pode muito bem encher de bens os famintos, encher de alegria os tristes, encher de forças os cansados, encher de esperanças os que sofrem, encher de pais e irmãos os sozinhos, encher de coragem os medrosos, encher de fé os incrédulos e encher de poder os fracos. É assim que Deus põe um ponto final à assombrada plenitude do vazio!
(Extraído da revista Ultimato edição Março de 1998, pagina 66)

Nenhum comentário: